“Experimentando o vermelho em dilúvio.” processo 2, 2016, performance, São Paulo – SP. Foto: Marcelo Paixão
A votação popular do prêmio Pipa online deste ano contou com um terrível episódio que envolveu a artista Musa Michelle Mattiuzzi, que pode contar com o apoio de sua rede que divulgou amplamente o acontecido.
Perto do término da votação, houve uma virada de votos acompanhada de ataques de cunho racista, misógino e gordofóbico ao perfil pessoal da artista, que estava em primeiro lugar e subitamente passou à segunda posição.
A questão no caso de Musa foi a estarrecedora mudança nas horas finais, em que os votos do candidato Jorge Luiz Fonseca, que estava em terceiro lugar, mais que duplicaram, contrastando com todo o restante da campanha da última semana. Ao mesmo tempo em os votos pra Jorge cresciam exponencialmente, Musa era alvo de mensagens e manifestações com o intuito de agredi-la, intimidá-la e constrangê-la em seu perfil pessoal do Facebook e em suas postagens que denunciavam a suspeita virada. Viam-se diversos perfis de adolescentes curtindo com risadas os posts de Musa e os respectivos comentários incrédulos de todxs xs apoiadorxs da artista nos posts nas quais ela acompanha a votação.
Foi possível também ver os comentários de ódio na página do prêmio no Facebook relacionados ao tipo de arte que Musa realiza e ao teor de sua poética de forte potência política de denúncia ao racismo e da sua própria figura, que era a de uma mulher negra possível ganhadora do primeiro lugar de um dois mais importantes prêmios de arte contemporânea do país.
O prêmio soltou uma nota afirmando que já havia premiado o “[…] artista cafuzo (descendente de negros e indígenas) Paulo Nazareth, e na categoria PIPA Online os vencedores foram os indígenas Jaider Esbell e Arissana Pataxó.” (Nota Prêmio Pipa)
A trollagem contra a artista deu-se possivelmente pela organização de grupos de direita que possuem comunidades de redes sociais e whatsapp que destilam ataques a minorias. Porém, em sua nota, o prêmio desconsiderou que o próprio caráter das manifestações no site do PIPA caracterizam o cyberataque à Musa. Ora, seria necessária comprovação de que as pessoas pertenciam a grupos racistas se elas executam um ataque racista individualmente ou não?
A pessoa de Musa foi exposta aos ataques para concorrer a esse prêmio, como bem ressaltou Nico Arawa em post que repercutiu no Facebook, aos custos de arcar com toda a perseguição virtual (cyberataque) sem contar com uma ação reparadora por parte do prêmio. Essa ação poderia ter sido concessão ao menos de um empate, dando o prêmio para Musa também em uma decisão soberana da comissão julgadora.
Importante pontuar que o prêmio não se exime de responsabilidade com processos de opressão e cyberataque relacionados à exposição da pessoa de Musa justificando a premiação de pessoas negras e indígenas em edições anteriores do prêmio. Musa Michelle Mattiuzzi teve sua votação expressiva pela sua trajetória coerente de anos e com sua poética madura e precisa. É de de assustar que uma organização fascista de última hora consiga realizar a trollagem de um esforço de dias em prol da campanha pela artista.
Quais os caminhos que se apontam para as comunidades artísticas que traçam um enfrentamento desses processos perseguição a artistas e ativistas?
É preciso e urgente que se atualizem os discursos sobre essas práticas para que a perseguição e exposição da artista não seja invisibilizada sob o manto dos discursos de “abraço à diversidade” que escamoteiam a violência dessas questões ao afirmarem que o prêmio busca “[…] salientar questões urgentes e a construir um debate relevante e de boa fé em torno delas”(Nota Prêmio Pipa), mas sim agir realmente para a reparação dessas atrocidades.
Todo apoio à Musa!
Musa Michelle Mattiuzzi
http://musamattiuzzi.wixsite.com/musamattiuzzi
Nota Prêmio Pipa
http://www.premiopipa.com/2017/08/pipa-online-2017-comunicado-do-premio-pipa/